Entra 10 minutos atrasado e senta-se ao meu lado segurando a mochila desajeitadamente entre as pernas. Sussurra algo a meia voz, sempre sem tirar os olhos do professor. É demasiado rápido e demasiado alemão. Arrisco o meu melhor Hochdeutsch para tentar pedir desculpa. Não consegui compreender, sou estrangeiro. Abre-se num sorriso e estende-me a mão enquanto me informa que também ele é estrangeiro; italiano. A rapariga à minha direita parece subitamente interessada na conversa e vira-se num gritinho abafado de “Italienische!”. Aparentemente tem um namorado italiano. De Milão, apesar de ter nascido numa cidade calabresa de nome indescortinável mas que provoca um aceno afirmativo no meu companheiro. Estendo-lhe a mão enquanto digo “João”. Ela arqueia um pouco as sobrancelhas mas não diz nada. «De Portugal, sou Erasmus». Ah…! Ela é inglesa, nascida em Brighton, de pais indianos. Nenhum dos dois parece achar interessante explicar porque acabaram a estudar na Alemanha. Não quero parecer provinciano por isso também não pergunto.
Entretanto, o seminário prossegue com a apresentação de uma estudante japonesa. Pertence à pequena legião nipónica do hospital, uma clique de 7 ou 8 rapariguinhas de cabelo preto impecavelmente esticado e ar langoroso e enfadado. Todas seguem o mesmo código de vestuário como se nunca tivessem saído do colégio em Osaka. A saia acima do joelho e as meias compridas um pouco abaixo do mesmo. Camisa branca e um pólo de malha em cujas variações diárias de cor se alojam todas as expectativas de individualidade. Infelizmente, o aspecto eternamente anémico retira qualquer potencialidade erótica ao conjunto. Entretanto, a rapariga fez jus à lendária paixão nipónica pela miniaturização e despachou o referat sobre infecções nosocomiais em menos de 10 minutos. Animo-me perante a perspectiva de uma saída antecipada para almoço mas pressinto que sou o único. Toda a gente está entretida em discussões frívolas sobre procedimentos operatórios. Há uma verdade inquestionável acerca do curso de Medicina: à medida que os anos avançam os temas vão ficando mais interessantes e as pessoas mais enfadonhas.
Sinto-me um Chatwin moderno, continental e comodista, mas guardando a mesma perplexidade perante os indígenas. Tem sido uma longa viagem até agora.
quinta-feira, 23 de abril de 2009
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